Cinema: “Lobos”, filme de José Nascimento sobre desespero e isolamento, um retrato do país
O filme acompanha a fuga de ambos, de carro e a pé, ao longo da qual vão entrando outras personagens, como o filho que Joaquim desconhecia, antes de emigrar para França.
“O que mais me interessou foi o sentido da fuga e do isolamento daquele homem [Joaquim], que tem um passado confuso, que não se conhece a si próprio e que, quando começa a ter consciência de si, é confrontado com o disparate da sua própria vida”, afirmou José Nascimento em entrevista à agência Lusa.
Rodado no norte do país, o filme termina na Serra da Estrela, num cenário inóspito e duro, marcado pela neve e pelo frio, que, segundo o realizador, remete para a ideia de isolamento e de fuga que atravessa toda a história.
O filme chegou a chamar-se “A monte”, título mais óbvio e directo para a história, mas José Nacimento acabou por escolher “Lobos”, porque ser um animal “que se afasta das povoações, se isola e é marginal”.
“As próprias personagens funcionam quase como lobos que saem de si próprios”, sublinhou o realizador.
Tal como dos seus outros filmes, José Nascimento diz que “Lobos” é um retrato dos portugueses e de “um país adiado”.
“Há uma espécie de ausência nossa em resolver os problemas. Somos muito dinâmicos até certo ponto e depois começamos a fazer disparates e desistimos”, diagnosticou o realizador, estendendo este cenário à relação dos espectadores com o cinema português.
“A resposta do público em relação ao cinema é ‘não quero ver cinema português, não me quero identificar com uma coisa dolorosa'”, disse José Nascimento.
O realizador admite que o seu cinema não é agradável, “é de conflitos”. “Esta – vincou – é a minha forma de interpretar as histórias. Não tenho nada esse lado da fuga ligeira, da superfície”.
Já lhe chamaram o “homem-sombra do cinema português” por só ter rodado três longas-metragens, mas o seu trabalho vai para lá dessa estatística.
Fez documentários, realização para televisão, montagem para outros realizadores e está a trabalhar actualmente com os Rádio Macau.
“É irrelevante se fico ou não na sombra. Não sou muito de entrar em partidos, grupos de pressão, lobbies”, garantiu.
É um risco que assume, sem fazer concessões e cedências e é por isso que filma tão pouco e alguns dos seus projectos ficam apenas no papel. Lamenta: “Tenho liberdade para filmar, quando me deixam filmar, quando me aprovam os projectos”.
Apesar de só se estrear em Março, “Lobos” terá uma antestreia terça-feira no cinema Monumental em Lisboa.
SS.
Lusa/fim