





«No frio Dezembro de 1995 li um artigo da Laurinda Alves, na revista O Independente, sobre o naufrågio de um barco de pesca artesanal no meio do rio Tejo.
Dois homens tinham perdido a vida. As circunstĂąncias em que se tinha dado o acidente pareceram-me, no mĂnimo, bizarras. As autoridades competentes, embora avisadas, nĂŁo saĂram imediatamente para o rio para os salvar. Os poucos pescadores, que resistiam Ă s normas da CEE para os estuĂĄrios, nĂŁo ousaram ir para o mar com a tempestade que estava e a burocracia para fazer sair um helicĂłptero de resgate da base aĂ©rea do Montijo, indiscritĂvel.
Isto tudo a dois passos de Lisboa.
Estava feito o quadro geral da tragĂ©dia. A maior parte da frota das canoas pesqueiras foi queimada, a pesca artesanal estĂĄ em extinção, o rio continua poluĂdo… A nossa prĂłpria cultura estĂĄ a ser mais uma vez devastada.
Peguei na minha cĂąmara de vĂdeo e comecei por fazer um levantamento pormenorizado da sequĂȘncia dos acontecimentos, recolhi os testemunhos dos sobreviventes e senti o desespero da espera e a dor das famĂlias. Envolvi-me definitivamente com os futuros personagens do filme quando soube que um dos pescadores era pai de uma amiga minha.
A dramaturgia estava desde o inĂcio traçada. O filme jĂĄ tinha começado, sem que eu tivesse dado por isso.»